CULTURA DO AUTOMÓVEL MOLDA A MENTE
Meu amigo Jorge é uma pessoa bastante inteligente. No último fim de semana, como fazemos sempre às sextas-feiras, após o final de nossos trabalhos, reunimo-nos em um bar de costume, a fim de relaxarmos as tensões acumuladas e exercitarmos a difícil arte do diálogo, sempre confortada com alguma cerveja e salgadinhos.
Ali nos deixamos ficar por tempo alongado, falando sobre os diversificados assuntos atinentes ao grande progresso por que passa a humanidade. Parece que nossas mentes se complementam numa identificação de interesses, deixando em nossos cérebros idéias mais bem estruturadas porque, como costumamos dizer, nossos pensamentos são construídos a duas cabeças. Há muitos anos sou um admirador do Jorge, pela sua capacidade de discernir, bom senso, pureza de caráter, cabedal de conhecimento e, sobretudo, pela sua inteligência. Nesses nossos encontros semanais, creio que sempre saia ganhando. Sem confessar a ele minha fraqueza, parece-me que eu aprendia mais do que conseguia ensinar
Mas, no último diálogo que mantivemos, fiquei bastante desapontado com o amigo. Parecia ser tão inteligente e, no entanto, fez uma observação que me pareceu inadequada às suas qualidades e em desacordo com as realidades de nosso pujante progresso.
Estávamos discorrendo sobre a construção de novas pistas a serem acrescentadas a uma rodovia federal quando apontou sua cabeça com o indicador e disse: — Essa gente do governo é muito incompetente. É estupidez construir apenas 8 pistas, 4 em cada sentido. Onde já se viu uma coisa dessas! Deveriam fazer logo 40 pistas, senão daqui a poucos anos vão ter que acrescentar mais faixas, pois é preciso considerar o desenvolvimento do país e acompanhar o crescimento populacional.
Francamente, dizer que o governo deveria construir uma estrada com 40 pistas! E eu que pensava ser o Jorge uma pessoa atualizada e inteligente! E não aceitou meus argumentos quando lhe contestei. Parecia-me ter mudado a personalidade, retroagindo na sua capacidade mental. Naquele dia encerramos o diálogo mais cedo – aborrecidos – e cada um foi para casa. Naturalmente, matutando sobre esse desacordo. Quem não percebe que 40 pistas é muito pouco? Não vêem que o razoável seria a construção de 400 pistas? De cada lado. Seriam 800 pistas no total. E isso é o mínimo. O melhor mesmo seria a construção de 2.000 pistas em cada sentido, no total de 4.000 pistas. Claro! Com esse inchaço populacional, e as indústrias de automóvel vomitando milhões de carros diariamente, o governo tem que tomar medidas coerentes, adequadas e realistas. Precisamos pensar no futuro!
E o Jorge, hein? Coitado, parecia ser tão inteligente!
2 Comentários:
Oi Maurício,aí está o que disse o Jorge;
Essa gente do governo é muito incompetente. É estupidez construir apenas 8 pistas, 4 em cada sentido. Onde já se viu uma coisa dessas! Deveriam fazer logo 40 pistas, senão daqui a poucos anos vão ter que acrescentar mais faixas, pois é preciso considerar o desenvolvimento do país e acompanhar o crescimento populacional.
Que pena,o Jorge só não pensou que outros meios veículares logo estarão por aí e é certo que nem precisarão de meia pista,quanto mais de 40.
Isso me faz lembrar da historia do XUXÚ,pois com tantas pistas será que sobrará espaço para se plantar para a alimentação ???
Afinal,ainda precisamos nos alimentar para poder ser motorista e dirigier,NÃO ???
Caro Ira,
O artigo, como você bem entendeu, tem - com o uso do exagero - um significado simbólico. Como quem lá diz: não vai sobrar espaço para plantar. Vai ser só estrada.
E o pior é que estamos caminhando para essa situação como realidade. Não será mais uma metáfora.
Como dizia o irresponsável, durante a revolução franquista, na Espanha: "viva a morte".
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