A INTELIGÊNCIA HUMANA E A "UNANIMIDADE BURRA DE SOLOMAN ASCH"
Autor: José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] A Terra tem cerca de 4,7
bilhões de anos. A vida no Planeta surgiu há cerca de 3,5 bilhões de anos no
período Arqueano, mas se ampliou e diversificou nos últimos 550 milhões de
anos. Os dinossauros, por exemplo, povoaram a Terra entre 250 e 65 milhões de
anos atrás. Diversas formas de vida surgiram e desapareceram, mas a riqueza da
diversidade está em torno de 9 milhões de espécies atualmente. O ser humano (homo
sapiens) é uma das espécies caçulas do Planeta e adquiriu sua atual
compleição física e mental há cerca de 200 mil anos.
Mas
a despeito de ser uma espécie “caloura” na Terra, o ser humano se acha superior
às demais espécies e se considera o dono do mundo. O raciocínio e a
inteligência são as armas do poderio humano. Mesmo que de maneira heterogênea,
alguns seres humanos, especialmente os mais egoístas, simplesmente se acham no
direito de dominar e explorar a natureza e as demais espécies. Outros, mais
altruístas, se consideram apenas como “guardiães e cuidadores de toda a
criação”. Em geral, a ideia de “superioridade humana” varia de grau, mas é
amplamente aceita e é um fenômeno generalizado.
Porém,
a vida no planeta Terra se desenvolveu de maneira espetacular independentemente
da inteligência humana. A biodiversidade se expandiu e se contraiu de acordo
com as condições climáticas e as eras geológicas. Cada continente criou suas
próprias formas de vida e cada região possibilitou o desenvolvimento de
espécies endêmicas, com suas belezas particulares. Durante milhões de anos, a
vida seguiu o seu ciclo e o resultado da evolução das espécies foi de uma
riqueza incalculável.
Todavia,
o homo sapiens, com sua inteligência e raciocínio instrumental,
conquistou todo o Planeta, embora sem se importar muito com os direitos de
existência dos ecossistemas e a estabilidade do clima da Terra. O ser humano
está criando, inadvertidamente, uma nova era geológica, o Antropoceno. Nesta
nova era geológica, a civilização humana cresce e ocupa todos os espaços, mas a
diversidade da vida se reduz e se restringe no espaço. No rumo atual, a
inteligência humana está criando, de maneira não antecipada, uma estrada para o
ecocídio
No
geral, a progressão humana tem significado regressão ambiental. Mesmo assim, a
maioria das pessoas continua louvando a inteligência humana e ignorando os
danos que nossa espécie tem causado à Mãe Terra e às demais espécies nossas
parentes. Sem dúvida, a humanidade construiu lindas obras arquitetônicas,
desenvolveu a ciência, a tecnologia e criou muitos objetos de consumo que são
atraentes e desejados. Mas o modelo de desenvolvimento da humanidade não é
sustentável e deveríamos questionar até que ponto somos inteligentes, ou
vivemos uma grande ilusão coletiva? Somos inteligentes ou nos auto-enganamos?
Estamos presos ao Espírito de corpo e ao comportamento de manada?
Para
dar uma resposta a estas perguntas é bom recorrer ao estudo de conformidade ao
grupo de Solomon Asch, que surgiu a partir do questionamento sobre a capacidade
de raciocínio lógico diante das forças sociais que moldam as opiniões e as
atitudes das pessoas. O psicólogo Solomon Asch (1907-1996) quis mostrar com
seus estudos que os indivíduos tendem a aceitar o errado por conformidade ao
grupo.
Os
termos “O estudo de conformidade de Solomon Asch” ou “A unanimidade burra de
Solomon Asch” surgiram em função de experimentos onde um grupo de pessoas era
mantido em uma sala para responder perguntas – em voz alta. Porém, do grupo,
apenas uma pessoa desconhecia as condições do teste e tinha que responder por
último, enquanto os demais participantes eram atores que estavam no experimento
para dar uma resposta incorreta ou contra o raciocínio lógico. Os resultados
mostraram que o desejo de pertencer a um grupo fizeram os indivíduos abrirem
mão de suas convicções, do pensamento lógico ou da respostas que julgavam
certas. No conjunto dos experimentos, três quartos dos participantes escolheram
a alternativa errada pelo menos uma vez, cerca de um terço erraram a maioria
das respostas e 5% dos voluntários escolheram a opção incorreta todas as vezes.
Desta
forma, “A unanimidade burra de Solomon Asch” questiona a capacidade do ser
humano utilizar sua inteligência de maneira independente e racionalmente
neutra. Ou seja, o desejo e a necessidade de se integrar ao ambiente homogêneo
faz com que as pessoas abram mão da capacidade de raciocínio e passem a agir de
maneira burra.
Isto
é tanto mais verdade quando se considera as ideologias, as religiões, as
culturas e, principalmente, a máquina mundial de propaganda de estilos de vida
consumistas. As pessoas abrem mão dos seus princípios para copiar o padrão
hegemônico de consumo. Os indivíduos se deixam levar pelas opções da maioria e
adotam as preferências induzidas pela sociedade do espetáculo e pelo
inconsciente coletivo.
Se
extrapolarmos as conclusões de Solomon Asch, não é difícil imaginar que ao
invés de espécie inteligente e sábia, o ser humano simplesmente segue o efeito
manada, se iludindo com o poder do consumismo, mas continuando com um modelo
econômico insustentável. Certamente não é uma opção inteligente ignorar todas
as consequências negativas da destruição humana na era do Antropoceno.
Por
exemplo, a inteligência de Victor Frankenstein criou um monstro, assim como a
inteligência científica criou a bomba atômica. A inteligência humana criou o
desenvolvimento econômico e o progresso, mas a generalização de um modelo
insustentável está gerando um outro Frankenstein, com resultados que podem ser
desastrosos.
Porém,
nos experimentos de Solomon Asch, 25% das pessoas deram respostas consideradas
certas e não se importaram com as alternativas erradas apontadas pelo grupo
majoritário. Portanto, existe um percentual relevante de indivíduos que podem
ser consideradas independentes do efeito manada e não se constrangem em
contrariar as respostas da maioria, permanecendo fiéis à lógica do raciocínio e
das opiniões da maioria.
Portanto,
é burrice considerar que a inteligência dá direitos excepcionais aos seres
humanos, mesmo quando seus efeitos estão destruindo o único lar habitável. A
maioria das pessoas – configuradas ou influenciadas pelas agências de
propaganda e publicidade – estão seguindo o comportamento de manada que pode
resultar na destruição do Planeta.
O Homo
sapiens, em certo sentido, está se tornando Homo burrus. O
modelo de desenvolvimento atual tem usado a inteligência humana para produzir
grandes obras e objetos, mas, ao mesmo tempo, estimula a cegueira e a
ignorância quanto aos seus resultados ambientais.
Não
é inteligente seguir a “unanimidade burra” e continuar na marcha rumo ao
precipício ecológico.
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista
do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em
Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências
Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal.
E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
Fonte:
EcoDebate.
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